Nos meses de outubro e novembro de 2009 um grupo de malucos se encontrou em uma oficina de crônicas na Estação das Letras, sob a batuta do mestre Felipe Pena. O prazer de estarmos juntos foi tão grande que, ao fim do curso, entre chopes e batatas fritas, resolvemos prosseguir, mesmo sem saber onde isso vai dar. De lá para cá nos encontrando semanalmente para ler textos, nossos ou não, discutir literatura e falar da vida... E claro, beber alguma coisa, que ninguém é de ferro.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
Ei você aí me dá um dinheiro aí, me dá um dinheiro aí!
Aqui pertinho de casa, tem um mendigo que nunca pediu dinheiro. Mendigo ou morador de rua? Existe uma definição? Não sei de nada, como já disse, mas desconfio muito. O mendigo, digo o morador de rua, mora na rua desde que eu vim morar aqui, há 15 anos. Ou ele já morava antes? Eu o chamo de Tatuagem.
Alto, magro, sempre de bermudas, nunca o vi usando camisa. Anda quase sempre descalço. Uma vez ou outra usa uma daquelas democráticas sandálias que não deveriam soltar as tiras. Tatuagem está sempre com um sorriso no rosto que, não pude deixar de notar, ao longo destes anos, mudou muito. Quase não há mais dentes em seu sorriso.
Tatuagem me ajuda. Se preciso passar num lugar aqui pertinho, e que eu sei que é perigoso, pergunto: - Tatuagem posso ir?
- Tá liberado, pode ir. Responde. E nos segue com o olhar para ver se nem um pivete vai bulir comigo ou com as meninas. Quando minhas filhas eram pequeninas, me ajudava a atravessá-las no sinal. Se certificadva se os carros haviam parado e como um guarda de trânsito, me fazia sinal para seguir tranquilamente.
Tatuagem nunca me pediu nada. Nosso relacionamento é de vizinhos: - Oi tudo bem?
- Tchau!
- Nossa que chuva a de ontem, hein?
Vejo que ele gosta de conversar. Está sempre trocando um dedo de prosa com o guardador de carros e com o segurança aqui da rua. Tatuagem não assiste televisão. Sorte a dele. Assim não precisa assistir a total mendicância que virou a televisão brasileira.
Já pela manhã bem cedinho, acreditando talvez que deus ajuda a quem cedo madruga começam os pastores a pedir. Ultimamente ando obcecada por um pastor americano que pede nada menos que NOVECENTOS reais. O pastor é um velhinho de cabelos escandalosamente pintados de preto, com um rosto de biscoito "Trakinas". Será que alguém deposita os, repito, NOVECENTOS reais na conta do pastor traquinas?
Seguindo os pastores, seus pedidos e seus sermões, começam os jornais locais com pedidos de dinheiro e tudo o mais para as tragédias locais. Os programas femininos tem um jeitinho todo especial de pedir o tutu, entre uma receita e outra, lá vai o número da conta.
A tarde a programação infantil pede descaradamente para que a criança enlouqueça seus pais pedindo para que les comprem " de um tudo" sem limites.
A noite os jornais "nacionais" pedem dinheiro para tragédias mundiais. Tsunamis, tufões e furacões.
Nos fins de semana, que a tv brasileira descansa e nos brinda com uma programação lamentável, vêm os shows, para pedidos de dinheiro. Pestalozzi, criança esperança, teleton etc e tal e infinito e além.
Isto sem contar com os pedidos do governo, que para poder manter a pobreza (seu eleitorado) aumenta os impostos, cria novos impostos e não repasssa nada.
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Esqueci de assinar! Márcia
ResponderExcluirParabéns Paçoca, pela brilhante crônica. Sua crítica social está primorosa. O estilo leve e afetuoso torna a leitura agradável apesar da gravidade do tema tratado.
ResponderExcluirUm abraço do Pé de Moleque
Querida Mariola, ops, Paçoca..
ResponderExcluirJá tinha desistido do blog, pois há muito tempo eu tentava entrar e só dava que estava fora do ar. Hoje sem querer, fiz minha última tentativa e eis que me deparei com a sua crônica.
Que delícia de ler, concordo com o Luigi sobre a gravidade do tema, mas adorei o Tatuagem, lembra aqueles mendigos que tinham antigamente, a gente corria deles, mas gostava dos danados...
Beijos saudosos