Nos meses de outubro e novembro de 2009 um grupo de malucos se encontrou em uma oficina de crônicas na Estação das Letras, sob a batuta do mestre Felipe Pena. O prazer de estarmos juntos foi tão grande que, ao fim do curso, entre chopes e batatas fritas, resolvemos prosseguir, mesmo sem saber onde isso vai dar. De lá para cá nos encontrando semanalmente para ler textos, nossos ou não, discutir literatura e falar da vida... E claro, beber alguma coisa, que ninguém é de ferro.
quarta-feira, 7 de abril de 2010
A Hecatombe da Pracinha
Claudia Bontempo
Outro dia levei um pontapé no peito em Ipanema. Não foi de um pivete que ataca senhorinhas na rua para roubar-lhe os pertences. Nem de um pitboy treinando para ser feliz. Sequer me deixou com um hematoma roxo, visível a olho nu. Foi uma pancada mesmo na alma, que demorará muito para sarar e, toda vez que eu me deparar com o que me machucou, voltarei a sentir a dor da primeira vez.
Eu vinha de carro pela Visconde de Pirajá, ouvindo uma musiquinha no rádio, quando o trânsito começou a ficar lento ali pela altura da rua Vinicius de Moraes. Pensei que poderia ser da feira hippie, já que era domingo. Distraída, meio aborrecida, fiz umas continhas de cabeça, espiei as vitrines de algumas lojas e conversei com meus botões em voz alta, só para não perder o costume de falar sozinha de vez em quando.
Observei os sinais abrirem e fecharem várias vezes, fiz o movimento de pés entre a embreagem e o acelerador à exaustão, tamborilei com os dedos no volante. Era Ipanema engarrafada, numa tarde perfeitamente entediante.
Mas de repente, meu coração disparou e minhas pernas ficaram trêmulas. Comecei a suar e a ter calafrios ao mesmo tempo, meus olhos viam algo, mas não acreditavam no que estava ali à minha frente. Seria uma alucinação com certeza. Aquilo não poderia ter acontecido. Ninguém no mundo seria capaz de tamanha iniqüidade. Olhei em volta, a fim de ter certeza de que todos ao meu redor estavam tão horrorizados quanto eu. Mas só vi pessoas agindo como se nada estivesse acontecendo. Cada vez que me aproximava da Coisa, mas o mal estar tomava conta de mim.
Dizem por aí que na iminência do fim, fazemos um flashback de nossa vida, mas o que me veio à memória naquele momento foi a lembrança do meu primeiro beijo na boca; Estávamos na praia quando começou a chover, saímos correndo de mãos dadas, meu coração aos pulos de alegria, ao passarmos pela General Osório, ele me abraçou a fim de me proteger da chuva e nos beijamos , no ambiente bucólico da pracinha.
Voltei à realidade, antes que morte do meu sonho se apoderasse de mim. Confusa, cheguei a acreditar que estava diante de um ícone da arquitetura contemporânea, ou que talvez eu estivesse negando a praticidade do futuro, a sua ousadia ,o seu valor. Mas confesso que até hoje não me convenci e ainda estou a me perguntar; que mente perversa foi capaz de projetar a saída da estação do Metrô da Praça General Osório ?
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Parabéns, Claudia
ResponderExcluirVocê definiu bem: "mente perversa". Só uma cabeça desmiolada e má poderia tripudiar dessa maneira sobre o senso estético do carioca.
Lindo exemplo de crônica que traduz as emoções produzidas por uma cena pela qual passamos todos os dias e a aceitamos sem atentar para o que ela efetivamente representa.
A descrição do impacto e sua analogia com o beijo estão geniais.
Luigi
Perfeito!! Compartilho da mesma opinião!!!
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