quarta-feira, 12 de maio de 2010

COISAS QUE EU QUERO CONTAR

Quero contar os amores que vivi e os amores que perdi.
Quero contar as dores que sofri e os males que causei.
Quero contar de vales e cordilheiras por onde andei.
Quero contar de lagos e montanhas onde nasci.
Quero falar das árvores que plantei, dos filhos que criei e dos livros que não escrevi.
Quero contar as desventuras por que passei nos mares que singrei e nos ares que cruzei.
Quero contar como é dura a vida na caatinga, a pele calcinada pelo sol, o olhar de angústia na criança faminta, o riso amargo saindo das rugas do velho desamparado.
Quero contar o pôr do sol no São Francisco, o brilho da lua cheia no Capibaribe, o verde cristalino do mar além dos arrecifes.
Quero falar dos vinhos que bebi e da sede que sofri.
Quero contar como ressoa o apito da fábrica, como estala a batida intermitente do tear e como ecoa a voz alegre da tecelã.
Quero contar como vivem as almas penadas dos insetos assassinados nos campos de lavoura.
Quero contar fábulas. Para dizer cobras e lagartos, engolir sapos, desvendar o segredo da aranha, cantar como a cigarra, ser astuto como a raposa, ágil e faceiro como o serelepe, vaidoso como o pavão. E beber como um gambá.
Tudo isso quero contar. E antes que os tempos acabem, quero deixar pronto o meu epitáfio, que contará:
“Aqui jaz aquele que pouco contou.
Porque o que contou era verdade. E ninguém acreditou.
Aqui jaz aquele que sofreu a angústia de não saber contar
tudo aquilo que queria contar”.
Severino

6 comentários:

  1. Querido Severino,
    adorei! Que bom que alguém inspirado e verdadeiro apareceu para dar vida ao nosso blog.Queria que as palavras me amassem com te amam para poder fazer um comentário a altura deste belo texto! By the way: a paçoca entendeu tudo!

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  2. Oi! sou eu de novo! Queria dizer que o texto passa verdade quando consegue passar a emoção de quem escreveu! E o Severino é mestre nisso.
    Só tenho uma ressalva ao texto! Não repetiria a palavra vivi em tão pouco espaço.

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  3. Querido Mestre,
    Ah a angústia dos escritores que procuram as palavras para traduzirem os sentimentos !
    Um belo relato desta busca constante, que nunca se acaba. Que palavras escolher ?
    Divino ! Coisa de Mestre.
    Beijos

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  4. Obrigado, Paçoca. Fiz a correção no "vivi". Também dei um retoque no título.

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  5. Lindo, Luigi, de verdade
    Acho que ter o que contar mostra o quanto se está vivo e integrado ao mundo!
    E faz com que eu me sinta culpada por estar tão distante de escrever, nos últimos tempos.
    beijo
    Monica

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  6. quando falamos verdades ninguém acredita... mas gostam de inventar mentiras sobre nós... ô, vidinha!

    pouco conta, muito soma, bem faz você.







    //@.

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