
A vermelha de listras roxas ou a azul de bolinhas? Droga de dúvida, mulher é que entende de combinar roupa. Deixa ver: a calça é azul marinho, se colocar blusa também azul vai ficar esquisito tudo da mesma cor, mas vermelho e roxo também não dá! O Belarmino está certo, preciso mesmo de uma namorada. Diabos, cadê a blusa branca com listras cinzas, essa vai ficar boa, só falta não estar passada. Passar agora não dá tempo, Belarmino já deve estar chegando. Ah, está aqui. Agora vamos ver: sapatos pretos com meias pretas, loção pós-barba, desodorante, um perfuminho – não, vou ficar cheiroso demais, tudo misturado nem eu agüento. Deixa ver que horas são: seis e meia, legal, gosto de ficar pronto antes de todo o mundo, dá até para ensaiar uns passinhos, há séculos que eu não danço.
Quem será que vai a esse tipo de baile, baile da terceira idade? Só falta encontrar todo o bairro lá. Melhor é não pensar nisso que eu acabo desistindo, prometi ao Bela que dessa vez eu não deixaria furo. Mas como se faz num baile de terceira idade, a gente convida a dama para dançar, como no meu tempo? Agora é tudo moderno, mulher faz tudo igual a homem, será que vão tomar a iniciativa? E a música, meu Deus, imagina se começa a tocar esses funks, hip hops, raps de hoje em dia, nem sei como se dança isso e meus joelhos não agüentam, amanhã nem levanto da cama! Tem que tocar as músicas da minha época, Roberto Carlos & Jovem Guarda, Elisete, Caubi, uma beleza. Vamos ver, se for para dançar de rostinho colado tudo bem, ainda dou para o gasto, pelo menos vexame não vou passar!
E o Bela que não chega! Cinco para às sete, ele marcou às sete, ô povo para gostar de chegar atrasado! A gente ainda tem que andar a rua toda, é um estirão até o clube, ir de carro seria uma roubada. Ele disse que costuma encher, um saco para achar vaga, quando encontra têm os flanelinhas para levar uns trocados da gente. E de carro não daria para tomar umas geladas, sacanagem com o Bela, eu bebendo e ele olhando, seco. Será que devo ligar para ele? Já são sete, vai ver nem saiu de casa ainda! Droga, celular fora de área, telefone fixo não atende, ele deve estar a caminho. Bela, cadê você, seu puto?
E as meninas, que tipo de menina vai a baile de terceira idade? Pelo nome, terceira idade, devem regular comigo. O Zé me disse que eu tinha que arranjar uma gatinha, dessa todas malhadas, que moram na academia, mas não dá, não gosto de mulher musculosa, acho horrível. E depois, convido para jantar e ela me vem com rodízio de folhas! Deus que me livre. Eu gosto é de mulher de verdade, que olha nos olhos, sabe fazer um carinho, dançar juntinho de rosto colado, conversar, andar de mãos dadas pela rua. Se vamos a um restaurante, come com gosto um bom prato, me acompanha na cerveja e na branquinha, na feijoada dos sábados... Que não faz cara feia quando ganha uma caixa de bombons porque está de regime, pelo contrário, come com gosto, nem se tem que ir a festa de criança. Não me importa se é gordinha, gordura é excesso de gostosura, já dizia a minha mãe, nem precisa ser uma maravilha de bonita, mulher já é bonita por ser mulher! Há quanto tempo não tenho uma namorada assim, meu Deus, sei lá, já perdi as contas, a última foi a Carminha. Arranjar brotinho? Nem morto! Imagina só, ao invés de “tio Vavá” ser chamado agora de “tio Sukita”?! Deus que me livre! Cadê o Bela, cacete, já estou ficando nervoso, sete e quinze e nada, será que ele desistiu? Ou se esqueceu de mim? Eu mato o Bela, se ele me deixar na mão hoje, agora que fiquei animado!
Eu devia é ter comprado as flores como eu queria e o Bela não deixou, disse que era cafona, eu iria pagar mico chegando no baile levando flores, flores para quem, Vavá? Ora, para as damas, todas merecem flores! Não adianta, o tempo passa e eu continuo um romântico incurável, nasci e vou morrer romântico! Lenço...deixa ver...ah, está aqui, perfumadinho como deve ser. Sem lenço nem morto, dá que a dama precisa e eu não tenho, isso sim é que é pagar mico! Deixa eu aproveitar também e reforçar o desodorante, do jeito que já suei esperando o Bela daqui a pouco o desodorante vence.E aproveitar também para dar uma espiadela no visual, nunca é demais conferir para ver como as moças vão me olhar: nada mal, mas se eu estivesse caminhando como jurei que faria este ano eu já teria perdido esta maldita barriga, pelo menos um pouquinho, eu não nasci com ela, ela é que veio depois para me aterrorizar. Tudo bem que já está por aqui há uns 20 anos, mas agora que decidi dar cabo da maldita deveria ter cumprido a promessa de Ano Novo, mas agora também não tem jeito, para hoje vai assim mesmo, para o próximo baile eu capricho mais!
Ah, a campainha, Belarmino, filho de uma puta, até que enfim!